terça-feira, abril 20, 2010

Dr. Paulo Papandreu escreve ao Sr. Paulo Sant'Ana sobre o caso Nardoni

Sr. Paulo Sant'Ana

Todos nós, de alguma forma, temos responsabilidade pelo que acontece lá e aqui conosco.

O Sr. já escreveu, com direito e mérito, que sua coluna é "um canhão aqui no Rio Grande do Sul", e que os gaúchos invertem, leêm o jornal Zero Hora de trás para frente, para logo começar por saber o que diz o Paulo Sant'Ana. Estas são verdades.

Muitos de nós, se criaram como tentando ser anônimos discípulos do seu modo de pensar - sagaz, despojado e corajoso. Além disso, para quem o lê, salta aos olhos que a sinceridade é o seu ponto mais forte. Também sinceramente lhe digo que seu desempenho no Caso Nardoni está aquem de suas possibilidades.


Apesar da atenção demonstrada em suas suscessivas colunas tratando do Caso, o Sr. mostra-se pouco mais do que um seguidor, relator, resumidor, e nas últimas um perguntador. Sendo um comentarista a quantidade de pontos de interrogação que o Sr. usou, em se tratando de um caso equacionado, é notável por incomum que é.


Ora! Ninguem duvida de que Isabella foi vítima de uma morte violenta.


Todos sabem que mortes violentas só pode adotar a forma de suicídio, homicídio ou acidente.

É pacífico que o suicídio está fora do quesível. Mas não pela idade da vítima, pela circunstância é que sim.

As pessoas intuem, quase sem dúvida, que acreditar que a explicação para o episódio como sendo o ato de uma terceira pessoa,  é como carimbar-se "otário" na testa.


Uma terceira pessoa espreitante, que no espaço de seis minutos ingressou no apartamento com chave dúplice, agrediu a menina na testa, arremessou-a ao solo com violência, esganou-a durante três minutos, abriu um buraco na tela, introduziu-a pelos pés, soltou-a em queda livre, primeiro um braço depois o outro. E saiu daquela residência sem ser visto ou deixar vestígios. Mas não sem antes organizar o lar: guardando os instrumentos usados, limpando parte do sangue projetado no piso, colocando panos de molho para a lavagem, e zeloso pela segurança chaveando a porta ao sair evadindo-se. Tudo isso aconteceria na iminência de retorno do pai da menina. Um adulto acreditar nisso, é como crer na existência do Papai Noel genuíno, em pessoa.

Sua coluna nos informa: "os dois argumentos exóticos preparados pela defesa são de rir". Diz mais: "o segundo argumento da defesa é mais risível do que o primeiro: Acidente Doméstico".


Então pelo visto está claro que o Sr. defende o que sempre defendeu: o casal é culpado de homicídio doloso, triplamente qualificado, um crime hediondo.

Tento e tento mas, pelo todo e muito escrito em suas colunas diárias sobre o Caso, não consigo entender seus motivos para também dizer: "Esse crime martela minha cabeça. E durante muito tempo não vai deixar de martelar".


Por que escrever isso? O casal não está preso e condenado? O que mais é preciso? O que desejamos agora? Não estamos satisfeitos com o resultado? Qual é a nossa preocupação? Qual é a nossa dúvida? O resultado final não nos pareceu bom? O que falta ainda acontecer com o casal? A justiça não está feita? Não é página virada? Nossa sede de justiça ainda não está saciada? Será que não está fazendo falta pena de morte?


Parece que devemos ainda dar vazão a mais pensamentos inquietantes e mórbidos.


O que aquela pequena criança disse ou fez para desencadear a ira do casal? Impropérios? Quem sabe a menina tentou também esganar o irmão menor?

Quando a madrasta agrediu-a com uma chave de porta, talvez de fenda ou com um anel portado no dedo, será que o pai parabenizou sua esposa pela ação corretiva executada na filha?


E após isso, qual foi o primeiro dos dois da dupla quem sugeriu que devessem, ao invés de levá-la ao pronto socorro para suturar o ferimento, matá-la no interior do próprio lar?

Será que a menina ouviu a combinação do casal que, obrigatoriamente, aconteceu ainda na garagem? Ou então será que a dupla de fascínoras cochichou para que as crianças não ouvissem seu plano?


Qual dos dois excomungados foi o que tapou a boca da vítima para que o porteiro ou alguém não ouvisse o choro e os gritos havidos antes deles subirem pelo elevador?

Por que o sangue no carro era imperceptível a olho nu? Por que não havia nenhum sangue no trajeto até o apartamento? Por que, se o sangue foi limpado no carro e uma fralda usada para impedir sangramento na área de condomínio, foi este pano retirado logo ao entrar no apartamento? Por que a deixariam sangrando para depois ter que limpar?


Para ter tido impulso suficiente, quanto acima da cabeça o pai agressor elevou o corpo da vítima antes de jogá-la com violência ao piso? Qual o tamanho da fúria necessária para assim proceder?


Será que não foi o próprio filicida que esganou a menina em ato contínuo ao arremesso havido junto ao sofá da sala?

Será que não foi a madrasta que, para ganhar tempo, cortou a tela de proteção enquanto acontecia a esganadura?


Será que enquanto a menina era agredida e esganada ela estava com os olhos esbugalhados não acreditando no que acontecia mas vendo a morte chegar?

Enquanto essas agressões à filha aconteciam na presença das demais crianças, será que o irmão maiorzinho poderia ter pensado que seria ele o próximo?


Será que não existiu aí algum ato incipiente de canibalismo? Tal como sorver o sangue que fluia do ferimento na face? Ou então quem sabe se agacharam e lamberam parte do sangue derramado no assoalho? Será que se isso aconteceu não pode ter confundido a perícia à imaginar que o rosto e o piso foi limpo para esconder as evidências do crime? Será que não aconteceu alguma outra espécie de abuso?

Por que o casal se desentendeu durante o ritual de trucidamento e defenestração? Será que algum deles foi contrário a uma parte da selvageria? Quem sabe um deles não queria atirar a vítima pela janela? Poderia ter argumentado que, para culpar a terceira pessoa, esta atitude não seria necessária, ou até contraproducente?


Será que o casal medicava a criança morta com anticoagulantes, antiadesivos plaquetários? Será que ela era hemofílica? Será que alguma destas possibilidades pode vir a ser a explicação para que a menina ainda estivesse sangrando doze minutos depois de ferida na testa?


Por que aquelas duas bestas não preferiram matar de modo insuspeito? Será que não poderiam tê-la afogado no mar, já que dias antes passaram uma temporada na praia simulando serem uma família normal?


Por que não fizeram exame psiquiátrico neles? Será que o que eles apresentam é uma psicopatia já conhecida e classificada ou trata-se de uma nova síndrome emergente? Também pode ser só maldade efêmera? Ou não?

Será que não é perigoso levar as crianças remanescentes para visitá-los no presídio? Quem garante que uma dessas crianças não poderia vir a ser mais uma vítima? A segunda figurante de uma série que iniciou com a primogênita?


Por que motivo a menina gostava de frequentar aquele ambiente de uma família transtornada e desconstruída na essência?


O que dizer dos pais dos dois psicopatas? Por que os apoiam? Fazer ou apoiar barbaridades seria algo familiar e duplamente genético?

E os advogados de defesa, é claro que podem dizer que os acusados são inocentes, mas fazem com que pareça sincero este dizer, é coisa de ótimos atores - todos eles não parecem ser no caso?


Por que existem três médicos, veteranos, que estão a afirmar que a esganadura não existiu e/ou que o Acidente Doméstico explica a dinâmica do ocorrido. Incompetentes? Querem aparecer? Talvez sejam masoquistas querendo ter o povo contra si? Seriam três pessoas que associaram-se formando uma quadrilha de médicos falsários? Ou então são lacaios do dinheiro que brota da fonte Nardoni e Jatobá? No mínimo, não seriam três lunáticos que se encontraram ao acaso mas que mesmo assim devem ser separados e punidos, ou tratados?

Por que o promotor disse em plena comemoração da vitória conseguida em púlpito "O júri não é ciência exata. Mas o resultado do julgamento mostrou que eu estava certo"? Será que foi por elegância, quis ele dividir as folhas de louro com os jurados e por conseguinte conosco também, seria isso?


Será que é certo apenas as autoridades que atuaram no Caso serem distinguidas com honrarias por terem cumprido o dever de ofício? E o povo que foi decisivo não deveria ganhar um feriado para comemorar o feito? Quem sabe poderiamos ser contemplados com o Dia da Justiça? Criar uma data, que ainda não existe, para comemorá-la?


Por que vamos duvidar das provas? Elas não são oficiais? Timbradas, carimbadas e assinadas? Será que os céticos e recalcitrantes não podem lembrar o loteamento do lixão do Bumba? Mas o que isso tem a ver? Será que não enxergam que aquilo lá naquele morro é um caso isolado de chancela oficial inadequada?

Quanto ao Senhor rir da levantada hipótese do Acidente Doméstico, por curiosidade, poderia tentar escrever em um pedaço de papel, mas de maneira objetiva e cartesiana, os motivos que explicam seu riso. Compartilhando seu saber sobre o Caso, talvez possamos então com seu auxílio, encontrar algo que justifique existir alguma graça em meio a essa tragédia toda.


Att


Paulo Papandreu

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